Julio Ramón Ribeyro esteve nas antípodas do boom literário latino-americano dos anos 1960. Muito introvertido, não fez frente à expansividade de seu compatriota Vargas Llosa. Esquálido, mostrou-se incompatível com a robustez de García Márquez. Sua prosa também se caracterizou pela magreza extrema, notabilizando-se como mestre do conto e do relato inclassificável. Viveu em Paris, como alguns outros célebres autores do boom, mas nunca saiu de si mesmo: de suas obsessões tabagísticas e existenciais, e da imersão nas vidas minúsculas de seus personagens citadinos. A respeito da má recepção de seus contos por leitores europeus e da forma que a América Latina era descrita por seus colegas, afirmou: O Peru que represento não é o Peru que eles imaginam ou representam: não há índios ou há poucos, não ocorrem coisas maravilhosas ou insólitas, a cor local está ausente, falta o barroco e o delírio verbal. Sutil caçador de ironias e fumante de carteirinha, contista perfeito idolatrado por ninguém menos que Juan Rulfo e Julio Cortázar, foi um preciso observador da existência cotidiana. Nestas Prosa apátridas (nas palavras do próprio Ribeyro, textos que não se encaixam plenamente em nenhum gênero), através de fragmentos que oscilam entre anotações em um diário, aforismos e o ensaio filosófico, o escritor peruano explora novas formas de representar uma realidade que se percebe irremediavelmente fraturada. Com elegância e amargura, cada anotação leva o leitor a refletir sobre literatura, infância e velhice, amor e sexo, memória e esquecimento, em um livro que registra a passagem de uma sensibilidade ímpar pelas encruzilhadas do mundo.